quinta-feira, 22 de outubro de 2009

LANÇAMENTO!!!




Já se encontra disponível meu mais novo folheto com duas poesias de tom humorístico e sarcástico "Compra de Voto é Bom Demais" e "Chamego com Viúva"!



O folheto tem a capa elaborada pelo eminente cartunista Eliabe Alves Davi, ao qual, desde já agradeço imensamente!!!

DIA DOS PAIS


Estávamos vivenciando um sábado normal, daqueles que a tarde cai insuflando na gente uma nostalgia arrebatadora. O sol se foi e Paulo e eu viramos os óculos para cima da cabeça, fazendo com que os olhos demorassem alguns segundos a se acostumar com a claridade terna de fim de tarde. Guto preferiu colocá-lo na gola da camiseta azul celeste. Zeca não tinha o mesmo privilégio. Seus oito graus de miopia não permitiam tal ato a não ser na hora de dormir ou tomar banho. Em cima da mesa, dezesseis garrafas de cervejas e os copos suados pelo degelo da bebida que esquentava, já denunciavam o tempo e o alto grau de embriaguês em que nos encontrávamos.
Paulo nos incitou a fazer planos para o dia seguinte, mas logo foi interrompido por Zeca.
— Comigo não contem! — Exclamou antes de se explicar — Amanhã é dia dos pais e vou ver meu velho em Acari, passar o dia com ele.
— Também quero ver o meu amanhã, vamos nos reunir para ir ao sítio. A família inteira. Se quiserem aparecer lá... — Falou Guto deixando-nos um convite sem pretensão.
— Vixe! Nem lembrei! Também pudera, nunca tive pai mesmo! Meu pai me abandonou na barriga da minha mãe e até hoje, confesso que não fez um “pingo” de falta. Nunca lembro o dia dos pais. É que dia mesmo?
— Não tem data definida não Paulo! — Expliquei — É sempre no segundo domingo do mês de agosto.
Depois de todo o desabafo de Paulo, Guto e Zeca começaram numa batalha. Cada um contava uma história de heroísmo do pai. Uma viagem juntos. Até mesmo surras e mais surras que levaram no tempo de pequeno, principalmente Zeca que fora mais travesso nos tempos de meninice e teve um pai menos intelectualizado.
Eu, ao contrário de todos, nada dizia. Permanecia ouvindo, tomando a cerveja e vez por outra passando o dedo no suor do copo que ensopava o guardanapo embaixo do recipiente. No outro dia, nove da manhã, saí da missa, passei na floricultura, comprei um vaso com orquídeas e dirigi-me ao endereço do meu pai, onde residia há 23 anos: Quadra 11. Rua dos Jardins. Túmulo 12. Pus o vaso com carinho sobre a lápide, conversei um pouco com ele e agradeci pelos únicos três anos que passamos juntos no tempo em que eu nem sabia desejar um “feliz Dia dos Pais”.

sexta-feira, 14 de agosto de 2009

UMA CERTA CLÁUDIA


Dirigia-me a Caruaru. Era meio dia quando desci do ônibus em Campina Grande para esperar a próxima viação que me levaria ao destino final. Sentado no banco da rodoviária, abri uma bolsa, tirei um livro novo que um amigo me emprestara e continuei minha leitura, já estava na pagina 102 para ser mais exato. Minutos depois, chegou uma mulher procurando alguma coisa dentro de sua bolsa, confesso que nem me notou, mas por instinto foi sentando-se ao meu lado para tentar encontrar o que procurava mais despreocupada. Parei a leitura e fiquei observando-a naquela pequena empreitada pessoal. De repente um ar de alívio, e ela tirou da bolsa uma fatura de um cartão de crédito. Finalmente ela olhou para mim e me cumprimentou com um simples aceno de cabeça. Fiz o mesmo e fingi continuar lendo, mas alguma coisa me atraía naquela mulher de jeito atrapalhado.
Tinha corpo franzino, morena, cabelos estirados e com reflexos que a deixavam com cara de mulher ainda mais madura. Devia ter seus trinta anos. Seus olhos eram negros e penetrantes. Seus cílios fortes denotavam não precisar nunca de rímel algum. Puxou o celular da bolsa, pôs o fone e levou aos ouvidos. Pegou o cigarro, o isqueiro e acendeu sem a mínima educação de perguntar se eu fumava e se a fumaça não me incomodaria. Mas fato é que toda essa naturalidade dela demonstrava certa independência que me atraía, me sufocava.
Sem me conter mais, parti pra o ataque:
— Eu poderia pedir seu isqueiro emprestado, ou perguntar as horas, mas você vai ver que eu não sei fumar e que também tenho relógio, então era só uma desculpa pra eu chegar perto de você. Portanto tomei coragem e vim perguntar seu nome.
— Cacau, Cláudia, mas pode chamar Cacau.
— Nossa você é mesmo um bombom. — Falei sorrindo da minha própria desgraça
— Suas duas cantadas foram péssimas. — Disse com um sorriso debochador.
— Confesso, sou péssimo em cantadas. Mas e aí, você mora onde?
— Acho que você já sabe demais a meu respeito. Meu nome é Cláudia, sou separada e tenho dois filhos que moram comigo em algum lugar deste planeta.
Pelas suas respostas audaciosas percebia-se a inteligência daquela mulher que me conquistava cada vez mais. Sempre procurando um jeito de me deixar encabulado, seguia me perguntando e respondendo coisas da vida, não da dela é claro. Ela me deixava afogado em desmedida curiosidade. A atitude de manter segredo sobre sua identidade me seduzia profundamente. Entrei no jogo.
Depois de muita conversa e olhares, arrisquei um convite.
— Que tal um cerveja pra curar esse calor paraibano?
— Logo se vê que você não tem o mínimo jeito pra mulher! Um cavalheiro convidaria pra tomar um vinho, um champanhe... mas eu aceito a cerveja!
Quase aos pulos de felicidade, peguei as malas dela, a minha e saí lado a lado com Cacau. Chegamos ao bar, pedi uma cerveja e tomamos, ela parecia adorar. No correr das conversas contei praticamente toda minha vida. Ela continuava debochada, mas na rispidez das respostas dela eu percebia também por parte dela uma atração por mim. Depois de três garrafas, fiz-lhe um convite na certeza de que não aceitaria, mas me surpreendi com um decisivo “sim” dela. Propus dormirmos ali em Campina Grande, numa pousada, num hotel, seja lá o que fosse. Ela ligou para alguém, disse que só chegaria no dia seguinte, eu também liguei pra meu tio que me esperava em Caruaru e disse que havia perdido o ônibus e dormiria ali para viajar no próximo amanhecer. Mentiras criadas, mentiras aceitas. Almoçamos, fomos procurar uma pousada ali mesmo perto da rodoviária. Cláudia continuava sem me dar a mínima pista de quem ela realmente era. De certa forma aquilo começava a me incomodar, mas eu percebia claramente que era um jogo dela e eu não poderia fazer nada a não ser jogar também.
Passeamos pela cidade durante o resto da tarde como se fôssemos um casal de namorados. A essa altura Cláudia já sabia que eu era casado e que tinha uma filha de cinco anos. Onde eu morava, onde eu trabalhava, telefone, pra qual lugar eu ia e de onde vinha. Posso concluir que ela, nesse momento, sabia praticamente tudo da minha vida. Porém eu só sabia seu nome, que fora casada e que tinha dois filhos.
A noite na pousada fizemos amor plenamente por exatas três vezes regado a vinho, suor e gemidos. Apenas a luz do banheiro do quarto acesa, deixava no ambiente uma penumbra que conseguia esculturar o corpo de Cláudia. A claridade dúbia sempre transforma o rosto e o corpo de uma mulher mais misterioso do que parece.
Às quatro horas da manhã, meio bêbados e exaustos, deitamos lado a lado e rimos exageradamente, entorpecido por quase três garrafas de vinho. Tomei banho, voltei pra cama. Cláudia levantou, pegou a toalha, e se dirigia ao banheiro quando perguntei:
— E o jogo não acabou?
— Que jogo? — respondeu-me com outra pergunta e sacudindo o cabelo para o lado.
— Você não vai me dizer quem você é?
— Já te disse: sou Cláudia, me chamam de Cacau, sou separada e tenho dois filhos.
— Você é muito seca! Não vai me dizer onde mora, seu telefone, o que faz da vida...?
Ela me olhou com cara de ternura, dirigiu-se à bolsa que estava no criado-mudo, procurou a carteira. Pensei comigo que ia me dar o telefone, mas inusitadamente me deu a carteira de identidade.
— O que significa isso? — Perguntei estonteado sem entender a ação.
— Olhe bastante para ela, é tudo que você vai saber sobre mim! — Entrou no banheiro e ligou o chuveiro me deixando desnorteado e ao mesmo tempo com um sorriso no rosto.
— Louca! — Exclamei alto, debochando da situação — Já que você é cacau eu poderia te fazer uma serenata, dizer que é um prestígio estar com você, que seu batom é delicioso, e que seus olhos são um diamante negro...
— Para! Continua com péssimas cantadas. (risos), então está bem... se eu fosse te apelidar com comida te chamaria o quê? (pausa) — Fiquei ansioso para ouvir o que viria daquela louca — Hot Dog! Isso: Cachorro Quente, muito cachorro e muito quente.
Gargalhamos desesperadoramente, ela saiu do banheiro, tomou a identidade de minhas mãos, guardou-a, tirou a toalha e deitou-se apenas de calcinha.
— Descobriu quem sou eu? — perguntou-me referindo-se a consulta feita na identidade!
— Que você se chama Cláudia Oliveira Barbosa? Que nasceu em Solânea, Paraíba, no dia 05 de abril de 1980? E que sua identidade foi expedida pelo estado da Paraíba no dia 20 de julho de 1997?
— Exatamente isso! Nossa você conseguiu decorar tudo isso? — Perguntou-me depravadamente!
— Mas sua identidade é de casada...
— Mas já te falei que sou separada. Meu nome realmente é Cláudia não é?
— Sim!
— Então, é sinal que não menti pra você! Estou omitindo muitas coisas, mas não menti em nada! — Beijou-me e virou para dormir! Não demorei a adormecer também, estava cansado por tudo: pela viagem, pela noite de amor e ébrio graças a bebida dionisíaca.
Somente às dez horas consegui acordar. Cláudia não estava do meu lado, pensei que estivesse no banheiro. Enganei-me. Somente o lençol amassado e um bilhete no criado-mudo me davam a certeza de que não tinha sido um sonho. Peguei o bilhete na esperança de encontrar o telefone dela, novamente outro engano: “Pra falar a verdade adorei o ‘bombom’, o ‘diamante negro’. Amei a noite, foi maravilhosa, digamos que você está entre os três melhores homens que já tive. Beijos! Assinado: Uma certa Cláudia”. Foi tudo que restou de uma noite inesquecível.
Abri a carteira, guardei o bilhete, aprontei-me e segui para a rodoviária rumo a Caruaru, pensando incessantemente numa “certa Cláudia” ou seria a Cláudia certa?

quarta-feira, 5 de agosto de 2009

O FILHO PRÓDIGO


Estava próximo do carnaval. Eu era um homem que sempre ia às missas na Matriz de Santo Antônio de quem sou muito devoto. Nunca fui um papa-hóstia, mas gostava dos sermões da missa de domingo, adorava comungar ao menos uma vez por mês e como bom católico me confessava, não todo ano como manda a Igreja, mas nunca passei mais que dois anos e meio sem ir aos pés do padre contar meus pecados que nunca fora “cabeludos”: bebia minha cerveja no fim de semana, adorava e fazia tudo pelos meus dois filhos Edgar e Moisés e sempre tratei muito bem a minha esposa, Francisca, com a qual sou casado há vinte e seis anos.
Moisés, de nome bíblico, nunca fora adepto de nenhuma igreja. E por ironia do destino, Edgar, de nome não bíblico, fora coroinha por volta de uns 14 anos e aos 22 se convertera à Assembleia de Deus. No começo achei meio estranho, mas depois me acostumei e até gostei, era uma preocupação a menos, Edgar trabalhava, não ia festa, logo casou-se e como todo bom evangélico, não preciso falar, não bebia bebida alcoólica.
Certo dia, como já falei próximo do carnaval, fui surpreendido por um convite feito por Edgar, ele que nunca interferira na minha vida católica e muito menos na minha bebida de fim de semana, também nunca mudara o meu comportamento por causa da bebida, era mais uma forma de relaxar, já que a semana toda eu trabalhava.
— Pai, o Senhor e a mamãe não desejaria ir ao retiro espiritual da minha igreja nesses dias de carnaval? — Perguntou-me quase na certeza de que eu não aceitaria. Ledo engano. Aceitei na bucha.
— Por mim... vou perguntar se Francisca quer ir, se ela for eu vou.
Nunca havia participado de algo tão maravilhoso, eu nunca gostara mesmo de carnaval, não ia me fazer nenhum pouco de falta. O retiro foi esplêndido.
Ao voltar não pensei duas vezes em passar frequentar a Assembleia, havia feito muitas amizades e me sentia bem no meio de toda aquela gente, me sentia leve, feliz. Em poucos dias tirei meus santos da parede, adotei uma bíblia a qual lia sagradamente todo santo dia. Assistia cultos na TV e nem preciso dizer que repelia cerveja e todo tipo de bebida alcoólica. Rezava apenas o Pai Nosso. Não fazia sinal da cruz, mas diferentemente de muitos protestantes nunca desprezei quem gostava de um bom vinho, uma cerveja ou algo assim, eu compreendia o prazer da carne que estas bebidas proporcionava, quando ingerido na medida certa é claro.
Mas com o tempo, uma coisa passou a me angustiar: os quadros dos meus santos empoeirando em uma caixa de papelão que eu guardava na despensa. Isso começou a me incomodar terrivelmente. Um dia parei, deu-me um estalo, senti saudades daqueles pedaços de madeira, daqueles pedaços de gesso que, não eram sagrados, tudo bem. Mas de longe levaria alguém para o inferno como eu passara a acreditar.
Há dias eu não sentia mais a alegria de quando ingressei para a igreja evangélica. Eu sentia uma enorme saudade de meus santos na parede, minha estátua de Santo Antônio de um metro, que eu mantinha no canto do quarto e que me dava tanto orgulho em possuí-la. De repente num estalo, fui até a despensa e de cara vi meu Santo Antônio meio empoeirado com o tempo e a caixa de papelão onde habitavam agora meus quadros. Chorei bastante, era o confronto da cultura em que fui criado com a razão e religião nova a qual eu adotara. Afinal, não seria também uma cultura o fato de não acreditar nos santos, não seria uma ideia da mesma forma equivocada. Quem estaria certo, quem pecava mais. “Depende de cada um” respondi a mim mesmo, existem evangélicos errados e certos, existem católicos certos e errados, assim como há o médico corrupto e o honesto, assim como são os políticos, padres, pastores, policiais. Tudo tem os dois lados da moeda não é mesmo? Era o confronto em minha mente de quem um dia resolve acreditar em duas ideias, duas teorias. Uma lágrima veio ao rosto, olhei para Santo Antônio, peguei um pano, limpei com uma copiosa delicadeza, como se fosse um ser humano abandonado, um enfermo. Beijei-o, pedi perdão. A estátua parecia me sorrir. Levei-a para o local de onde nunca deveria ter saído: do canto do meu quarto. Voltei, peguei a caixa e passei a limpar os quadros, um a um. A cada limpeza um beijo como pedido de desculpa e tornava a colocá-los a parede. O “Sagrado Coração” voltou para a estante. Ao terminar tudo me senti como se a poeira tivesse saído também de mim.
Que ideia a minha! Acreditar que iria para o inferno por conservar imagens. Os seis meses que passei na assembleia me foram valiosíssimos, tenho enorme apreço pelos irmãos, mas se é que Deus condena mesmo alguém, acho que ele teria muito mais coisa para julgar do que um homem trabalhador, casado e fiel, um “bom sujeito”, que sempre soube compreender e ajudar as pessoas, que criou os filhos maravilhosamente bem, que sempre tratou os pais de forma brilhante enquanto eram vivos. Não, definitivamente não! Deus não era esse em que eu passara a acreditar! Minha cerveja, meu vinho, até mesmo minha cachaça de vez em quando não me levaria ao inferno! Não foi esse Deus que eu conhecera!
Olhei para Santo Antônio e depois de meses fiz o sinal da cruz, beijei a estátua e comecei uma exaltada “Ave Maria”, depois um “Santo Antônio Pequenino”. Senti-me leve, a leveza de um paraíso, de um céu, percebi que o céu mora dentro da gente, que estar em paz consigo é estar salvo. “O senhor é convosco... amém”

sexta-feira, 3 de abril de 2009

UM OLHAR POR CIMA

Chegou ao trabalho, pôs as mãos na cabeça como quem segura o mundo que ameaçava cair. Pensou no que tinha a fazer, uma pilha de documentos para arquivar separando-os por período. Foi na cozinha, pôs um café quente, o cheiro adentrou pelas narinas, sentiu-se enjoado, mas de um trago só virou a pequena xícara. Pensou em acender um cigarro, mas não aguentava sentir nem o cheiro. A ressaca lhe comia o juízo, embrulhava o estômago e fazia-o suar como um condenado.
Saiu fora. Tomou um ar fresco. Pensou em ir embora e abandonar tudo para o outro dia. Olhou os pássaros fora, na mangueira em frente.
“Olha eles! Não precisam trabalhar e mesmo assim comem, não preciso estar nessa espelunca!”
Entrou novamente, desligou o computador falou para a recepcionista que só voltaria no outro dia. Abriu a porta do seu carro, deu a partida e ligou o ar. Agora sim. Um frio gostoso lhe corria o corpo. Fez a manobra e ao dar a marcha à ré bateu levemente no poste. “Merda que porra de dia esse meu!” falou chutando o pneu depois de constatar um pequeno arranhão na pintura do seu carro que acabara de comprar à prestação.
Foi então que Douglas viu um senhor passando, maltrapilho, trajava camisa branca (mas amarelada pelo tempo), dois botões apenas deixavam ver o peito com cabelos esbranquiçados, uma pele queimada pelo sol. Uma calça Jean’s também velha e dobrada abaixou para que não arrastasse a barra no chão. Chinelo de dedo também velho, assim como o homem, assim como a camisa, assim como a calça. A barba, também amarelada, dava-lhe a certeza de que se tratava de um fumante e não muito higiênico senhor. Devia ter uns cinquenta anos ou menos, mas tinha a aparência de um homem já muito desgastado pela vida, cansado e sofredor.
Douglas estacionou novamente o carro, entrou, ligou novamente o computador, a cabeça ainda doía muito.
- Érica, ligue para a farmácia, peça um analgésico dos bons por favor!
- Mas o senhor não falou que só voltaria amanhã?!
- O amanhã já chegou! – Falou sorrindo, Douglas que nunca fora essas simpatias todas.
Érica sorriu também e saiu para o telefone. Douglas agradeceu pelo emprego que tinha, pela sua juventude, por seu carro, mesmo com a arranhadura e começou fazer seus serviços!
É preciso ver pessoas menos privilegiadas que a gente para assim poder dar valor as coisas que temos!

sexta-feira, 27 de março de 2009

A CHEGADA DE JOÃO CARNEIRO NO CÉU

Nota: Seu João era um cidadão lagoanovense que não gostava de perguntas com respostas previsíveis, digamos: "perguntas idiotas"

No dia 20 de setembro
Do ano de 2005
João Damasceno de Medeiros
Com todo respeito eu brinco
Chegava nesse dia ao céu
Junto ao anjo Gabriel
Numa barca feita de zinco

João Carneiro
Assim era mais conhecido
Às vezes era ignorante
E ficava aborrecido
De pergunta besta num gostava
E se o cabra perguntava
Ficava logo arrependido

Pois assim se assucedeu
Com São Pêdo nesse dia
Quando João chegou lá
Num caderno ele mexia
Olhou assim pra João Carneiro
E disse muito ligeiro
Num acreditar no que via

---Seu João! O sinhor por aqui?
Ele disse:--- não é o Pelé
Pêdo ainda insistiu
---Cuma vai a muler?
---A mulher vai com as perna
Deixe logo de baderna
Diga logo o que quer

São Pêdo disconfiado
Com os tranca de seu João
Voltou a olhar pra o livro
Assubiano uma canção
Passou lá uns três minuto
E seu João muito astuto
Só prestano atenção

O santo levantou a cara
E lhe disse desse jeito
---Agora vou falar sério
E o sinhor fale direito
Deixano a prosa de lado
Vou dizer suas qualidade
E também os seus defeito

E começou o blá blá blá
O que João era o que João foi
Se eu tiver mintino
Pode aqui me dar um môe
Mas tanto Pêdo cuma João
Tava numa concentração
Que num piscava nem o oi

---O sinhô foi vereador
Na cidade de Lagoa
E apesar dos seus probema
Teve uma vida inté boa

E por isso eu lhe digo
Se ficar aqui comigo
O sinhô num fica a toa

---O sinhô também às vez
Era um pouco ignorante
Mas na terra ainda tem
Um monte de representante
Também isso num é defeito
O sinhô foi home direito
E também muito importante

---Aqui no livro do céu
Todo dia eu anoto
O que os home faz na terra
Eu com meu lápis pego e boto
Aqui tem seus dados gerais
Seus documentos pessoais
Tem até mermo uma foto

---Você nasceu no dia seis
Do bendito mês de mai
Ano 1917
Dano alegria a seus pai
E pra ganhar o seu dinheiro
Fez solda de João Carneiro
E vendia num balai

---Você foi comerciante
Um dos maiores da cidade
Vendia biscoito, bolacha, pão
Solda de boa qualidade
Foi casado com Bibi
Viveu todo tempo ali
Tinha 88 anos de idade

---No rodapé do livro
Foi que agora eu percebi
Uma informação importante
Que eu quase esqueci
O sinhô em 88 ano
Apesar de trabaiano
Ainda teve 14 fie

João Carneiro assim com a mão
Pediu licença pra falar
Disse assim: - Se é pra mentir
Seu São Pêdo pode parar
Eu num tive nenhum fie
E pelo que eu vi
O sinhô quer é me enrolar

São Pedro disse: - Teve
Seu João disse: - Eu não tive
- Seu João teve
- São Pedro, tive não
E ficou naquele impae
Naquele vai e num vai
Só naquela inrolaçao


São Pedro disse: - Seu João
O sinhô é cheio de nove hora
Vou dizer todos os nomes
Se eu mentir me bote pra fora
E se eu ganhar a aposta
O sinhô dá as costas
E daqui se vai imbora

Foi Janúncio, João e Josa
Só num sei bem a idade
Teve Nilton, Nilba e Nilma
Josito, Naira, Neide e Naide
Cunheço desde a primeira
Inté a derradeira
E também Neuma e Noraide

­­­­­­­­---São Pedro me desculpe
Vou ocupar o seu lugar
Isso aí é tudo mentira
E eu tem Cuma provar
Você tá falano besteira
Já perdeu sua cadeira
Agora eu vou me sentar

Eu nunca perdi aposta
Também inda num tô lelé
Esses nome que você disse
A verdade disso é
Pra acabar o zun zun zun
Eu nunca tive ninhum
Quem teve foi a muié

São Pedro se espoletou
Chamou João de ignorante
Jogou o livro no chão
Derrubou lá uma istante
Ficou Cuma os cabra do Iraque
Brabo virado num traque
E pariceno um gigante

E eu não sube mais de nada
De lá das bandas do paraíso
E as coisas que eu digo
Digo pruquê pesquiso
Doido eu não sou
Mas São Pêdo ficou
Sem um pingo de juízo

Só sei que no céu vai ter
Semana que vem uma ileição
Todos os anjo vão votar
Tem que dá sua opinião
E vi dizer que São Pêdo
Anda pelos canto cum medo
De perder para Seu João.

terça-feira, 17 de março de 2009

DIANTE DAS VITÓRIAS E DAS DERROTAS

Tudo vai ficar bem, você vai encontrar outra pessoa”. Era o que dizia Rubens para o seu amigo Edgar na mesa do bar ao embalo de cerveja e churrasco. Mas Edgar, extenuado só não chorava graças à relevante embriaguês causada pelas tantas cervejas que bebera a tarde toda. Sua noiva o traíra e havia embora com outro. Rubens continuava com os conselhos, as palavras de força para encorajar o amigo de tantas horas. De repente, mais um amigo chega à mesa e senta ao lado dos dois depois de cumprimentá-los.
“E ai como vão vocês?”, notando desânimo dos dois amigos Diógenes logo se intera ao assunto e consolida-se a eles. Força vai, apoio vem e Diógenes conta a novidade dele, são dois extremos, enquanto Edgar estar abatido, Diógenes conta que acabou de receber o resultado da promoção no trabalho e que vai entrar no curso de Direito, pois agora teria dinheiro para pagar a tão sonhada faculdade. Depois de parabenizado pelos dois amigos por suas vitórias, por seu sucesso profissional eles comemoram juntos num brinde ao amigo promissor, Edgar por um momento esquecia a aleivosia da noiva que amou durante longos cinco anos.
Rubens levantou foi ao banheiro. Estava morrendo de inveja do amigo promovido. Por que é tão fácil ser amigo e aceitar as angústias dos amigos? Por que era tão fácil dar força a Edgar e era tão difícil se vangloriar, se alegrar pela vitória de Diógenes? No fundo, no fundo somos acometidos de uma inveja natural, sentimos um desejo violento de possuir o bem alheio. Na verdade, é bom vermos que alguém anda pior que a gente, é bom para o ego do ser humano, sentir-se superior como há pouco Rubens sentia-se em relação a Edgar.
Pensou, suspirou forte e voltou para a mesa onde Diógenes e Edgar sorriam juntos, Edgar sim, sentiu-se feliz pelo amigo, esquecia por um momento seu problema, sua derrota. Amparava-se um pouco na gloria de Diógenes. Rubens não. Morria de inveja. Preferia o momento de antes onde se sentia superior ao amigo choroso e abatido.

terça-feira, 6 de janeiro de 2009

BELEZA

A única coisa que eu posso lhe dizer amigo é que conhecia Beleza desde que cheguei aqui nesta cidade, e que não via mal nenhum nesse cara. Não sei como era realmente o nome dele, se não me engano vi algumas vezes a mãe, que também não era boa da cabeça, chamá-lo de Antônio.
Passei a conhecê-lo quando minha mãe resolveu se mudar para esta cidade. Lembro bem do dia em que o vi pela primeira vez. Eu estava na banca de café da minha mãe, pois era disso que a gente tirava o complemento para as despesas da casa.
Beleza chegou, pediu um café, estava sujo, mas não podíamos menosprezar fregueses, servi-o sem desconfiar de nada. Em seguida ele pediu uma tapioca, entreguei-lhe imediatamente. Durante a conversa (se é que posso referir-me àquilo como conversa) percebi que ele não batia bem da cachola. Vi no mesmo instante um cidadão que olhava para mim e girava o dedo ao redor do ouvido e apontando para Beleza, dando-me sinal que aquele meu novo freguês era doido. Daí em diante passei a despistá-lo quando me pediu mais uma tapioca, um pedaço de bolo... Mas confesso que estava com medo dele, afinal não o conhecia e o sujeito podia ser violento. Mas não. Não era bravo coisa nenhuma.
Levantou-se de súbito e pediu-me então um pente. É um pente! Com muitos dias descobri para que ele queria aquele pente. Pois estava aí a origem do nome Beleza. Todos os moradores dessa cidade sabiam que quando ele chegava numa casa, depois de pedir comida, água ou outra coisa sempre findava por pedir um pente e se alguém dava ele se penteava, passava a mão no cabelo e dizia: — Beleza!!! — era o sinal de que estava pronto para o eterno passeio pela cidade. Devolvia o pente e saía.
Muitas pessoas já tinham o pente separado em casa para quando ele passasse. Beleza vestia-se mal: rasgado, com camisas de candidatos políticos dadas pelo povo que o conhecia. Andava sujo e mal cheiroso. No entanto não lhe faltava ninguém para tirá-lo a terreiro quando ele passava:
— E aí Beleza, beleza?
— Beleza de tudo, belezinha! — respondia o pobre diabo.
E era sempre assim a rotina dele: a pedir pão, água, comida e o pente, sempre o pente. Passei a adotar a mesma mania dos habitantes dessa cidade. Guardava sempre um pente em baixo da banca para emprestar a beleza. No começo até lhe dei alguns, mas fui avisado que não desse, pois ele sempre os perdia. De quebra, quando a feira estava boa, dava-lhe um café e uma tapioca em troca de ficar ouvindo suas lorotas sem nexo algum.
Lembro de uma em especial. A d’O Homem no Carro Sem Freio.
Beleza chegou pra mim e falou:
“— Rapaz, você soube do acidente que ia tendo com seu Gustavo da bodega?
— Não! — falei já sabendo que vinha mais um dislate — Como foi esse acidente Beleza?
Pediu-me uma xícara de café e depois que lhe servi ele começou:
— Seu Gustavo ia descendo a ladeira e quando chegou mesmo no meio da ladeira o carro faltou freio, e o carro só desembestando, desembestando e seu Gustavo nada de conseguir frear o carro, aí pra acabar de acertar seu Gustavo enganchou o pé no freio. Aí ficou danado mesmo! Seu Gustavo atrás de pular e não podia mais nem pular porque tava com o pé enganchado e o carro só descendo, descendo...
— E aí Beleza, o que foi que ele fez? — perguntei entusiasmado interrompendo-lhe o relato..
— Aí seu Gustavo deixou o pé lá no freio e pulou. Ele era bem besta de morrer por causa de um pé véi.
Terminava ali mais uma história sem nenhum compromisso com a verdade ou com a lógica, mas era mais uma das lorotas do doido que todo mundo gostava.
Pois é amigo, só é o que sei dele. E não consigo acreditar quem fez isso aí com Beleza. Ele não fazia mal a ninguém, vendo ele assim no chão, morto a pedrada é de cortar o coração, não consigo imaginar quem seria tão animal para fazer uma coisa dessas. Merece ser enforcado quando descobrirem. Devia estar bêbado ou drogado ontem à noite para cometer tamanho assassino, por que não escolheu outra pessoa? Logo Beleza! Não. Não consigo acreditar.
Olha! Veja só! Ainda está com o pente que eu lhe dei justamente ontem depois de tanto tempo que não lhe dava nenhum. Talvez ainda agonizando tenha penteado o cabelo e dito várias vezes “beleza de tudo, belezinha”. Afinal doido como era não devia nem saber que estava lhe chegando à hora da morte, não devia nem saber o que era morte, nem suas sensações.
Pois é amigo, se você chegou a pouco e não conhecia o homem aí estirado. Chamava-se Beleza, Chamavam-no de louco. Eu chamava “contador de causos”, meu contador de histórias favorito, só ele tinha a emoção e a inocência em dose certa.
Talvez fique melhor agora!